Adicionado ao www.rainhamaria.com.br em 13.09.2010 -
12.09.2010 - O Evangelho põe diante de nós dois pecadores: um, abandonando de modo consciente e deliberado o seu pai, vai para “um país muito distante” (Lc 15, 13); o outro, deixando a casa de seu pai, mas obedecendo às suas ordens, se compraz no trabalho no campo (cf. Lc 15, 25). Atenhamo-nos às palavras de Cristo. Ouçamos a parábola que nos narra o bom pastor.
Um homem tinha dois filhos. O mais moço disse a seu pai: Meu pai, dá-me a parte da herança que me toca. Porque era filho, o mais novo tinha uma herança que lhe tocava. Ora, um empregado, embora fosse bem servido (cf. Lc 15, 17), não recebia herança nenhuma. Na vida eclesial, podemos observar o mesmo. Pela porta do Batismo os homens se tornam filhos de Deus de fato. Sem Batismo, não somos merecedores da herança, já que nem filhos somos. Essa reflexão é importante, mas está mais do que claro que a herança da qual fala Jesus nesta parábola não é a herança eterna, mas sim a herança material, que são bens desse mundo. A herança que toca ao filho, na parábola, é constituída tão somente de riquezas materiais. Ora, se essa parábola é uma alegoria da reconciliação, então o que poderia representar essa “herança”? Meu pai, dá-me a liberdade. É o livre-arbítrio o bem que o Pai concede aos seus filhos. Bem que os faz capazes de amá-Lo, de obedecê-Lo, de glorificá-Lo. Ao mesmo tempo, bem que pode ser mal utilizado. Os homens, pelo ato da liberdade, podem também odiá-Lo, desobedecê-Lo, rejeitá-Lo. Meu pai, dá-me a parte da herança que me toca. Meu pai, faço agora uso de meu livre-arbítrio.
O pai então repartiu entre eles os haveres. Poucos dias depois, ajuntando tudo o que lhe pertencia, partiu o filho mais moço para um país muito distante, e lá dissipou a sua fortuna, vivendo dissolutamente. Foi-se embora o filho mais novo, partiu para um país distante, foi para longe de seu pai. Decidiu, como ser livre, partir. É a dura realidade do pecado mortal. “Toda iniquidade é pecado, mas há pecado que não leva à morte” (1 Jo 5, 17). E o pecado do filho mais novo é pecado de morte, segundo constatou o próprio pai: “Este meu filho estava morto” (Lc 15, 24). A doutrina da Santa Igreja Católica nos ensina que o pecado grave acontece quando temos plena consciência da ofensa, quando agimos dando à tentação pleno consentimento e quando a matéria do pecado é grave. Mas – pode se perguntar – por que não evitou o pai a partida do filho? Por que não recusou dar-lhe a herança? Quer dizer a nós o Pai: eu sou o Amor e desejo tê-Lo perto de Mim, em Minha morada. Mas, és livre. Dou-te a herança. Dou-te a liberdade. Pôs o pai diante do filho mais novo a herança. Pôs o pai diante do filho dois caminhos. “Ponho diante de ti a vida com o bem, e a morte com o mal” (Dt 30, 15). Pois que bondade haveria em um pai que obrigasse seu filho a amá-lo?
Diz a Escritura que o filho dissipou sua fortuna. Todos os bens materiais gastou o filho. Vivendo dissolutamente, acrescenta o Autor Sagrado. Pecou contra si mesmo, profanando o seu corpo, templo do Espírito Santo. É o que nos confirma o irmão mais velho, dizendo ao pai que seu filho mais novo “gastou os teus bens com as meretrizes” (Lc 15, 30). O que mostra esse pecado de dissolução cometido pelo filho mais novo? Mostra o quanto o homem se deixa seduzir pela impureza e pela fornicação. Muitos se perdem por ofender a virtude da castidade. Não tenho medo nenhum em dizer que são esses pecados de impureza os que mais conduzem almas para o inferno. E o filho mais novo, pelo pecado, tornou-se merecedor do inferno. Pelo Batismo, recebeu de Deus a graça santificante. Por seu pecado, perdeu a graça e tornou-se inimigo do Altíssimo. Dolorosa e angustiante situação na qual vivem tantos batizados… Caminham lentamente a um país distante, vagam fora da Pátria Celeste, vivendo dissolutamente e gastando seus bens com prostitutas.
Depois de ter esbanjado tudo, sobreveio àquela região uma grande fome e ele começou a passar penúria. “O salário do pecado é a morte” (Rm 6, 23). Penúria: foi o que experimentou o filho mais novo ao perceber que tinha buscado a felicidade no lugar errado. Depois da degradação, veio o vazio. Nada além de Deus pode saciar plenamente o homem. A euforia momentânea que vem com os prazeres carnais passa. Depois de ter esbanjado tudo, i. é, depois de ter experimentado a euforia do prazer, o condenado caiu em si. Sobreveio àquela região uma grande fome. Prazeres mundanos não saciam o homem. A refeição sacia o homem por algum tempo. Mais tarde, este precisa comer de novo, pois sente fome novamente. Depois de ter esbanjado tudo, o filho mais novo sentiu fome. Como?, pode perguntar o leitor. Acabou de se fartar, participando de festas com meretrizes e dissipando seus bens em comidas e bebidas, e já sente fome? Terrível a atitude do homem que deseja saciar os desejos de seu corpo, mas se esquece do bem de sua alma. Essa fome da alma é maior do que qualquer outra fome. Por isso o Evangelho fala de uma grande fome. Grande porque, assim como é maior a realidade da alma, realidade eterna, assim também saciá-la é mais necessário do que qualquer outra coisa.
Foi pôr-se ao serviço de um dos habitantes daquela região, que o mandou para os seus campos guardar os porcos. Desejava ele fartar-se das vagens que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. A que ponto chega o pecador obstinado! Quantos homens viris gozavam de relações com várias parceiras… Quantas mulheres belas e jovens se entregaram aos prazeres, dando-se a vários garotos… Esbanjaram tudo. Sentiram fome. E uma fome devastadora. Os relacionamentos com várias pessoas do sexo oposto não lhes trouxeram felicidade. Buscaram, então, “fartar-se das vagens que os porcos comiam”. Entregaram-se à dissolução, ao extremo da dissolução. E deram-se uns aos outros, praticando uns com os outros a torpeza, trocando as relações naturais para com pessoas do mesmo sexo.
Quantas pessoas não podem se encaixar no exemplo acima dado! Depois de tanto buscarem a felicidade nos prazeres mais leves, foram se afundando cada vez mais, a ponto de desejar se alimentar das vagens dos porcos! Na história do filho pródigo, ninguém deu ao moço as vagens dos porcos. Na vida de muitos hoje, no entanto, o mesmo não se pode falar. Fartam-se os homens as vagens dos porcos e muitos desejam afundar ainda mais nesse lamaçal miserável de perdição. Na parábola contada por Nosso Senhor, o filho mais novo entrou em si e refletiu. Hoje, os pecadores vão para terras distantes e cavam a própria cova conscientemente; vão trabalhar com os porcos e se tornam um deles sem muito trabalho. Pois não querem mais entrar em si e refletir, ou porque estão contaminados pela cegueira ou porque, vendo o caminho do Bem distante, se sentem desanimados. Deram-se de tal modo ao materialismo que acreditam que a carne agora lhes salvará. Duvidam das verdades de fé e o pecado… seria uma imposição da Igreja Católica. Quanta cegueira! Quanta imundície! Quanta devassidão!
Sim, cego, imundo e devasso é o pecador obstinado. A exemplo do filho pródigo, no entanto, todos – inclusive os que se obstinaram – são chamados a refletirem: Levantar-me-ei e irei a meu pai. Por que levantar-se? Porque está caído o pecador. Para receber o Sacramento da Penitência, a Igreja fala primeiramente do arrependimento, da contrição: Dir-lhe-ei: Meu pai, pequei contra o céu e contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho. O perdão não é concedido a quem é digno. E quem de nós é digno de receber o perdão de Deus? Recebemos o perdão pela Misericórdia do Altíssimo! E porque Sua luz atinge a nossa alma e reconhecemos o nosso pecado, voltamo-nos a Ele e acusamos os nossos pecados, ao que Ele nos responde, dando-nos Seu perdão e recobrando em nossa alma a Sua graça. Levanta-te, pois, homem! Ouve a voz do viajante que está à porta de seu coração e bate! Não seja tolo e abra-Lhe a porta! Não seja tolo e dê a mão a quem lha estende a ti.
Estava ainda longe, quando seu pai o viu e, movido de compaixão, correu-lhe ao encontro, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou. É o Pai que vem ao nosso encontro. Pelo ato da nossa liberdade, decidimos levantar-nos da queda do pecado, mas quem nos levanta de fato e nos dá de novo dignidade é o Pai. E quem é esse Pai? Fixemos o nosso olhar na figura de Jesus, o bom pastor. “Este homem recebe e come com pessoas de má vida!” (Lc 15, 2), reclamavam os publicanos e fariseus. Ora, a eterna tolice do homem, que se julga capaz de prescrutar os corações dos outros! As pessoas de má vida são os pecadores públicos. Podem tomar dois caminhos: ou se afundam no lamaçal do pecado ou se levantam e recuperam a graça. Para escolherem corretamente, precisam de um conselheiro que os ame. Esse conselheiro é Jesus. Os cristãos, à semelhança de Cristo, são obrigados a aconselhar aqueles que estão em situação angustiante de pecado. Os cristãos devem amar essas pessoas, assim como Cristo amou os homens e as mulheres de má vida. Diante da adúltera, Cristo dá amostra do verdadeiro amor: “Vai e não tornes a pecar” (Jo 8, 11). Amemos o pecador, odiemos o pecado. Não temamos correr ao encontro dos pecadores, e abraçá-los. Temamos correr ao encontro do pecado e aprovar-lhe.
Mas o pai falou aos servos: Trazei-me depressa a melhor veste e vesti-lha, e ponde-lhe um anel no dedo e calçado nos pés. Os injustos não possuirão o Reino dos Céus (cf. 1 Cor 6, 9). Os pecadores públicos reclamam hoje uma atenção especial. “Lembrem-se de Cristo e da adúltera, lembrem-se da Misericórdia de Deus!” A esses pecadores que pedem clemência mas não desejam mudança de vida, pedimos que se lembrem de reconciliar-se com Deus. Porque o filho mais novo recebeu melhor veste, anel no dedo e calçado nos pés porque voltou. Reconciliar-se é um ato que exige profunda humildade! “Não mereço ser chamado teu filho”, reconheceu o filho pródigo. Assim, é sempre bom lembrar as palavras de S. Paulo, que nos lembram a importância de nos humilharmos diante de Jesus Cristo, nosso Senhor: “nem os impuros, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os devassos, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os difamadores, nem os assaltantes hão de possuir o Reino de Deus. Ao menos alguns de vós têm sido isso” (1 Cor 6, 9-11). O apóstolo Paulo reconhece que muitos cristãos viveram em “um país distante”, dissiparam seus bens, foram pecadores. Ora, como distinguir os que possuirão o Reino dos céus de todos esses que constam na lista de São Paulo? “Mas fostes lavados, mas fostes santificados, mas fostes justificados, em nome do Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito de nosso Deus”. Pecadores todos nós fomos e somos. “Se dizemos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós” (1 Jo 1, 8). A diferença está no que vem depois disso. Somos filhos transgressores; só nos falta ser pródigos. Só nos falta humildade para reconhecermos os nossos pecados e acusarmo-nos diante de Deus, pedindo seu perdão.
Pecadores todos nós somos. Inclusive o filho mais velho. Lancemos um olhar sobre ele. A Escritura nos diz que estava no campo. Não estava na casa do Pai. Estava fora dali, apesar de perto. É a realidade do pecado venial. Com efeito, o filho mais velho não havia morrido, mas é certo que também pecava (cf. 1 Jo 1, 8). Qual é, no entanto, a diferença deste para aquele filho? As diferenças, na realidade, são duas. A primeira é a gravidade do pecado. As ofensas do filho mais novo são narradas pelo autor sagrado, enquanto as do filho mais velho estão ocultas. Este é inclusive exaltado pelo pai como um filho obediente e fiel. A segunda diferença é o reconhecimento do pecado. Por que, no final da parábola, nos é passada a impressão de que agiu certo o filho mais novo? Porque Cristo vem nos mostrar que ninguém é justo (cf. Sl 13, 1). Todos pecaram e estão privados da glória de Deus, escreve S. Paulo aos romanos. Onde está, então, a nossa esperança? “Se dizemos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós. Se reconhecemos os nossos pecados, Deus aí está fiel e justo para nos perdoar os pecados e para nos purificar de toda iniqüidade” (1 Jo 1, 8-9). O filho mais novo, assim como o mais velho, tinha pecados. Acontece que aquele reconheceu sua iniqüidade, enquanto este não só não reconhecia seus pecados, como, encolerizado, repreendia o pai por perdoar os pecados de seu irmão.
O desejo de reconciliação é importantíssimo diante da gravidade do pecado, assim como é infinitamente maior que nossos pecados a Misericórdia de Deus. Por que não perguntou o pai o que o filho tinha feito, os pecados que havia cometido? Por acaso o Cristo estaria desprezando a acusação dos pecados que fazemos diante do sacerdote no Sacramento da Confissão? Na verdade, Jesus Cristo quer nos mostrar que sua compaixão e seu amor por nós são infinitamente maiores que a nossa miséria. Não que não seja importante fugir do pecado! Longe de nós concordar com tamanho absurdo. Acontece que, tendo caído, é preciso buscar reconhecer a queda e levantar-se. O orgulho diante de Deus pode nos levar a outros pecados. A solução é, pois, a humildade. Aprendamos a nos colocar na condição de servos. Somos, sim, filhos, mas nos reconhecemos inúteis, dispensáveis.
Graça e paz.
Salve Maria Santíssima!
Fonte: http://beinbetter.wordpress.com/