Brasil: Arcebispo receberá R$ 100 mil pelo que sofreu na ditadura


29.09.2008 - A Comissão de Anistia do Ministério de Justiça reconheceu na sexta-feira (26), em Brasília, a condição de anistiado político do arcebispo emérito da Igreja Católica da Paraíba, Dom Marcelo Carvalheira, que foi perseguido, preso e torturado pela ditadura militar.

Reitor do Seminário Maior do Nordeste e professor da Faculdade de Filosofia do Recife (Fafire), Dom Marcelo foi preso em 1968, acusado de atividades subversivas e de esconder em seminários pessoas consideradas subversivas e foragidas da justiça.

Após 51 dias de cárcere e tortura teve suas atividades monitoradas por longos anos até o final da década de 80. Pessoalmente, jamais reclamou de modo formal por qualquer indenização em razão do sofrimento por que passou, mas receberá R$ 100 mil por decisão da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.

O ex-ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República Nilmário Miranda e outros religiosos perseguidos pela ditadura militar também foram reconhecidos como vítimas daquele regime durante a sessão extraordinária e histórica da Comissão de Anistia, que julgou 13 processos.

Realizada no auditório Dom Hélder Câmara, na CNBB, em Brasília, a sessão decidiu que Nilmário Miranda receberá uma indenização de 240 salários mínimos.

O primeiro religioso a ter a condição de perseguido político pela ditadura reconhecida foi o pastor metodista Frederick Birten Morris, preso, torturado e expulso do país em 1974. Ele vai receber pensão mensal de R$ 2 mil e indenização de R$ 285 mil.

Os outros anistiados e os respectivos valores são: Eliana Bellini, torturada por 20 dias em 1970 – indenização de R$ 714 mil e pensão mensal de R$ 4.713; o pastor Alanir Cardoso, preso e torturado em 1969 – indenização de R$ 468,2 mil e pensão mensal de R$ 2 mil.

As irmãs Helena Soares e Helder Dedendo e o padre Peter Mc Carthy, presos em 1981 na região do Araguaia, receberão cada um indenização de 30 salários mínimos. No caso de Maria Emília Lisboa Pacheco, não houve definição devido a um pedido de vista do processo.

O julgamento ainda prossegue e falta analisar outros quatro requerimentos: os de Alípio de Freitas, ex-padre português, Roberto Mendes, ex-militante do Movimento de Educação de Base, Ruy Frasão (post-morten) e Elia Meneses Rola.

Caravana da Anistia

O julgamento de sexta-feira fez parte da Caravana da Anistia, realizada no país (a 11ª). Presente à cerimônia, o ministro interino da Justiça, Luiz Paulo Barreto, ressaltou o caráter ecumênico do evento e disse que é fundamental reconhecer o papel da Igreja – seja ela católica, anglicana ou evangélica – na proteção às pessoas perseguidas durante o período de exceção no Brasil. “Muitos não tinham para onde ir e buscavam abrigo em templos. Esse papel hoje é reconhecido aqui nesse julgamento da Comissão de Anistia”.

Luiz Paulo classificou de “histórico” o julgamento na CNBB. Ele observou que o país encontrou um caminho para tratar do assunto sem revanchismo e disputa violenta, mas ponderou que esse “caminho da paz não implica caminho do esquecimento”.

É a mesma posição do pastor Morris, para quem “a chaga existente na sociedade brasileira jamais irá sarar, enquanto o Brasil não enfrentar total e abertamente o que se passou entre o golpe e a redemocratização e punir os responsáveis”.

O presidente da CNBB, Dom Geraldo Lyrio Rocha, destacou o simbolismo do julgamento, realizado no Auditório Dom Helder Câmara, um dos grandes nomes de resistência à ditadura e lembrou os “irmãos” que sonharam com uma “democracia não meramente formal, mas sólida, com liberdade, p articipação e exercício pleno da cidadania”.

O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, também enalteceu o papel dos religiosos na luta pela democracia. “Muitas pessoas lutaram pela redemocratização não somente por ideologia. Alguns única e exclusivamente por isso, mas muitos, talvez a maioria dos que resistiram, lutaram porque na sua história de vida tinham uma opção pelos mais fracos”.

Arquivos da ditadura

À saída do evento, o ministro interino da Justiça, Luiz Paulo Barreto, informou que a discussão sobre a abertura dos arquivos da ditadura está em estágio avançado e deve haver novidades nos próximos dias.

Segundo ele, há uma comissão coordenada pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para estudar o assunto. “Todos os documentos públicos serão abertos, ressalvados aqueles que, porventura, sejam secretos ou ultrasecretos”, disse, ao acrescentar que não há resistência dos militares, já que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, participa da discussão.

Fonte: Portal Correio


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