03.09.2008 - Em artigo publicado nesta terça feira, o Osservatore Romano, jornal do Vaticano, afirmou que os atuais critérios científicos que definem o fim da vida estão superados e isto pode criar problemas bioéticos na definição dos casos de coma e anencefalias.
Com base no relatório cientifico Harvard, publicado 40 anos atrás, em 1968, ficou estabelecido que o fim da vida de um ser humano é definido pela morte cerebral e não mais pela parada cardíaca.Segundo o jornal da Santa Sé, novos estudos colocam em discussão esses critérios.
O artigo do jornal é assinado por Lucetta Scaraffia, membro do comitê italiano de bioética, e vice-presidente da associação católica Ciência e Vida. Ela afirma que novas descobertas estão questionando a definição do sistema nervoso usada como justificativa científica do Relatório de Harvard.
"Neurologistas, juristas e filósofos concordam em declarar que a morte cerebral não é a morte do ser humano. Há risco de confundir coma com morte cerebral. Novas pesquisas colocam em dúvida o próprio fato de que a morte do cérebro possa provocar a desintegração do corpo", diz o texto.
Fim da vida
Na avaliação do jornal, aceitar a morte cerebral como sendo o fim da vida poderia colocar em discussão questões importantes para os católicos como a definição dos casos de coma e os de anencefalia.
Segundo Scaraffia, se uma pessoa deixa de existir quando o cérebro não funciona mais e seu organismo é mantido vivo graças à respiração artificial, significa que ela é identificada apenas através das atividades cerebrais e isto contradiz a definição de pessoa humana da doutrina católica e as normas da Igreja com relação aos casos de coma persistente.
"Se os teólogos católicos podem aceitar esta posição em caso de morte cerebral, deveriam aceitá-la também no caso de anencefalias", escreve o jornal, citando uma frase do filósofo australiano Peter Singer, especialista em ética e moral, com posições contrárias às do mundo católico.
De acordo com o Osservatore Romano, o relatório Harvard representou uma mudança radical na concepção da morte. Resolveu o problema da interrupção da respiração artificial, mas, sobretudo, tornou possíveis os transplantes de órgãos, aceitos por quase todos os países avançados.
O artigo sugere que a definição de morte cerebral tenha sido criada para favorecer os transplantes. "O problema dos transplantes não se resolve com uma definição médico-científica da morte", diz o jornal.
A Igreja Católica aceita que os órgãos para transplantes sejam retirados de pacientes com morte cerebral detectada, baseando-se na pressuposta certeza científica de que eles estejam efetivamente mortos.
Segundo o texto, ao consentir os transplantes de órgãos, a Igreja Católica aceita implicitamente esta definição de morte, mas com muitas reservas. "Na Cidade do Vaticano a certificação de morte cerebral não é usada", escreve Lucetta Scaraffia.
Reações
O artigo provocou reações de cientistas e médicos italianos. "O critério de morte cerebral para determinar a morte de uma pessoa é o único cientificamente válido. A comunidade científica mundial aprova os critérios do relatório Harvard. As críticas são baseadas em considerações não científicas, vindas de grupos minoritários", declarou Alessandro Nanni Costa, diretor do Centro Italiano de Transplantes.
A Sala de Imprensa do Vaticano divulgou uma nota esclarecendo que, por ora, não há mudanças na doutrina da Igreja. "Um artigo não muda a doutrina. Trata-se de um editorial do Osservatore Romano", explica a nota.
Fonte: Terra notícias