08.06.2015 -
Santo Afonso, um dos homens mais santos e sábios, gostava de recordar o fato seguinte.
Caminhavam por montes e vales uns homens ricos e amigos dos prazeres. Eram caçadores? Não sabemos; o certo é que se internaram pela floresta adentro e no meio dela, entre as árvores frondosas, encontraram uma choupana. Aproximaram-se e dentro dela viram um anacoreta, cujo rosto era o retrato duma alma que gozava de paz.
- Irmão – perguntaram aqueles senhores – que fazes aqui?
- Irmãos – respondeu o ermitão – vim procurar a felicidade.
- A felicidade? Nós gozamos da abundância das riquezas; corremos de diversão em diversão e, contudo, não pudemos achar a felicidade; e tu a procuraste aqui?
- Aqui a procurei e aqui a encontrei.
- Encontraste mesmo a felicidade?
- Sim; olhai por esta janelinha da minha choupana. Por aí se vê a minha felicidade.
Os caçadores precipitaram-se para a janelinha e olham ansiosos. Em seguida, mal-humorados, dizem:
- Irmão, enganaste-nos como um velhaco.
- Nunca, nunca – replicou o santo solitário; é porque não olhastes bem; tornai a olhar. Garanto que por aí se vê a minha felicidade.
Segunda vez chegam-se os homens à janelinha, olham por todos os lados e, agastados, dizem:
- Irmão, pela segunda vez nos enganaste. És um impostor.
E o solitário, com aquele ar de paz que nunca o abandonava, responde:
- Irmãos, não olhais bem. Asseguro-vos que não vos engano: olhai melhor, pois garanto que daí se vê a minha felicidade.
Os homens, desejosos de descobrir a felicidade, olham, tornam a olhar para baixo, para cima, para os lados… e por fim dizem:
- Irmão, não nos enganes mais. Por aqui não se vê nada; apenas e um pedacinho do céu…
- Isso, isso (exclamou radiante da alegria o ermitão), isso, isso. Aí está a minha felicidade. Quando tenho algum sofrimento, quando a dor me atormenta, contemplo esse pedacinho de céu e digo a mim mesmo: Tudo passa; dentro em pouco estarei no céu. A alegria enche a minha alma…
Esse solitário era Santo Antão. Fora para o deserto em busca da felicidade. Passou os longos anos de sua vida em orações e penitências. Olhava para o alto e via um pedacinho do céu! Teve lutas terríveis com o espírito do mal; não via o fim daquela guerra; mas olhava para o alto, e via um pedacinho do céu!
Sofreu fome, calor, sede; a carne pedia comodidade, o cilício atormentava-o, molestava-o a pobreza do hábito… Olhava para o alto e via um pedacinho do céu!
Passaram-se os dias e passaram-se os anos. Olhava sempre para o alto, e o pedacinho do céu parecia-lhe cada vez mais próximo, cada vez maior. Afinal, um dia não vê mais a terra, não vê mais o deserto. Ante seus olhos surgia uma cidade fantástica. Aquilo era a terra da promissão, era a pátria de Deus, era o que tantas vezes vira de longe: o céu! o céu!
E a alma de Santo Antão, que vivera para Deus, para a oração, para a penitência, para a santidade, para o céu, entrava gloriosa no paraíso…
Tesouro de Exemplos – Padre Francisco Alves
Fonte; Dominus Est
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Nota de www.rainhamaria.com.br
Lembrando o Artigo Publicado em 07.04.2015
Santo Afonso Maria de Ligório: No Céu a Felicidade Eterna e Perfeita
Satiabor cum apparuerit gloria tua — “Saciar-me-ei, quando aparecer a tua glória” (Ps. 16, 15).
Sumário. Posto que no mundo se encontrem muitas coisas formosas, não são, todavia perfeitas, e sempre deixam alguma coisa para desejar. Se, porém, tivermos a ventura de entrar no céu, o nosso coração estará perfeitamente satisfeito nessa ditosa pátria. Ali nada haverá que possa desagradar, e haverá tudo aquilo que se possa desejar. Ah, meu Jesus! Peço-Vos o céu, não tanto para Vos gozar, como para Vos amar de todo o coração.
I. São Bernardo, falando do paraíso, diz: Ó homem, se queres saber o que seja a pátria bem-aventurada, fica sabendo que ali nada há que desagrade, e que se encontra tudo aquilo que se possa desejar; Nihil est quod nolis; totum est quod velis. — Se bem que nesta terra haja alguma coisa que agrada aos nossos sentidos, quantas coisas não há que afligem? Se agrada a luz do dia, aflige a escuridão da noite. Se agradam a amenidade da primavera, a abundância do outono, afligem o frio do inverno e o calor do verão. Acrescentai a isso os sofrimentos na enfermidade, as perseguições da parte dos homens, as privações da pobreza. Acrescentai as angústias interiores, os temores, as tentações dos demônios, as dúvidas da consciência, a incerteza da salvação.
Mas quando os bem-aventurados entram no céu, não terão mais nada a sofrer: Absterget Deus omnem lacrimam ab oculis eorum (1). Deus enxugará de seus olhos todas as lágrimas derramadas sobre a terra; e não haverá mais morte, nem luto, nem clamor, nem mais haverá dor; porquanto as coisas d’outrora desapareceram. — No céu não há doença, nem pobreza, nem incômodos. Deixam de existir a alternação dos dias e das noites, do frio e do calor; é um dia perpétuo e sempre sereno, uma primavera contínua e sempre deliciosa. Ali não há perseguições, nem ciúmes; neste reino de amor, todos os habitantes se amam mútua e ternamente e cada qual goza da ventura dos outros, como se fosse a própria. Não há receios, porque a alma confirmada na graça já não pode pecar; nem perder a seu Deus.
Ó meu Jesus, pelo sangue que derramastes por mim, fazei-me digno de entrar um dia na pátria bem-aventurada. Não mereço o paraíso, mas o inferno, porque Vos hei ofendido tantas vezes pelos meus pecados; porém, a vossa morte me faz esperar de possuí-Lo um dia.
II. Totum est quod velis. No céu não somente nada há que desagrade, mas encontra-se tudo quanto se possa desejar. Ali tudo é novo e saciará os nossos desejos: Ecce nova facio omnia (2) — Eis que faço novas todas as coisas. Os olhos se deslumbrarão com a vida daquela cidade, cuja beleza é perfeita. Que maravilha não nos causaria a vista de uma cidade cujas ruas fossem calçadas de cristal, cujas casas fossem palácios de prata, ornados de cimalhas de ouro e de festões de flores! Oh, quanto mais bela ainda é a cidade celeste! Que delicioso não será ver todos os seus habitantes vestidos com pompa real, porque todos efetivamente são reis, como os chama Santo Agostinho: Quot cives, tot reges! Que será o ver a Maria, que aparecerá mais bela que todo o paraíso! Que será o ver o Cordeiro divino! Um dia Santa Teresa viu apenas uma mão de Cristo e ficou arrebatada em êxtase à vista de tão grande beleza.
Os perfumes suavíssimos e incomparáveis do paraíso regalarão o olfato. O ouvido será deleitado pelas harmonias celestes. Um anjo deixou um dia ouvir a São Francisco um único som da música celeste, e o Santo julgou morrer de contentamento. O que não será ouvir todos os santos e todos os anjos cantarem em coro os louvores de Deus? In saecula saeculorum laudabunt te (3) — “Eles te louvarão pelos séculos dos séculos”. O que não será ouvir Maria celebrar as glórias de Deus! A voz de Maria, diz São Francisco de Sales, é no céu o que é num bosque a do rouxinol, que vence a de todas as aves. Numa palavra, o paraíso é a reunião de todos os gozos que se podem desejar.
Ó meu Deus! Eu desejo e Vos peço o paraíso, não tanto para Vos gozar, como para Vos amar. Suplico-Vos, para glória de vossa misericórdia, fazei que os bem-aventurados vejam abrasado em vosso amor um pecador que tantas vezes Vos ofendeu. Tomo a resolução de ser d’aqui por diante todo vosso e de não pensar senão em Vos amar. — Assisti-me com a vossa luz e a vossa graça, que me dê força para executar esta resolução que Vós mesmo pela vossa bondade me inspirais. — Ó Maria, vós que sois a Mãe da perseverança, impetrai-me a fidelidade em minha promessa. (*II 133.)
1. Apoc. 21, 4.
2. Apoc. 21, 5.
3. Ps. 83, 5.
Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II – Santo Afonso